
Esquizofrenia ganha nova medicação.
Injeção foi aprovada no ano passado pela Anvisa e já está à venda. Opção facilita controle da doença, diminui efeitos colaterais e evita que pacientes desistam do tratamento
Publicado em 06/02/2012 | RAFAELA BORTOLIN
Uma nova injeção, aplicada mensalmente, promete facilitar o tratamento dos pacientes com esquizofrenia. Aprovada no ano passado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), a injeção de palmitato de paliperidona já está à venda e apresenta efeitos colaterais reduzidos em relação às drogas utilizadas atualmente, com a vantagem de dispensar a ingestão diária de vários comprimidos, o que evita que os pacientes desistam do tratamento, um dos problemas que mais prejudicam o controle dos sintomas.
Mitos
Veja o que falam sobre a esquizofrenia e que não é verdade:
Dupla personalidade
É um dos maiores mitos associados à doença. A pessoa com esquizofrenia não tem dupla personalidade.
O que acontece é que, durante as crises, ela passa a ter atitudes e comportamentos considerados bizarros e que não são compatíveis com sua personalidade em dias comuns, mas em nenhum momento ela pensa ser outra pessoa.
Mais inteligente
Esquizofrênicos são mais inteligentes que a média da sociedade. Na verdade, em longo prazo, o efeito é contrário. A doença causa uma deterioração da inteligência e a média de QI dos esquizofrênicos fica mais baixa que do restante da população. Esse mito é muito associado ao filme Uma Mente Brilhante, que mostra a história do matemático americano John Nash, prêmio Nobel de Economia em 1994, que tinha a doença. Segundo os especialistas, Nash é uma exceção e grande parte de suas teorias foram desenvolvidas antes que os surtos da doença se manifestassem.
Agressividade
Eventualmente, os pacientes podem ter reações agressivas, mas a maioria não tem qualquer episódio de violência. Em geral, por terem surtos nos quais falam coisas aparentemente sem sentido, os pacientes costumam serem vítimas de violência.
Vida normal
Ainda há um estigma de que a pessoa esquizofrênica não é capaz de fazer nada, mas hoje os tratamentos amenizam muito os sintomas e é possível que o paciente estude, trabalhe, se relacione com outras pessoas e tenha uma vida de sucesso.
Só remédios
O ideal é que o controle dos sintomas seja feito com remédios, mas que a pessoa também faça terapia e seja acompanhada por um psiquiatra, um psicólogo, um enfermeiro e um terapeuta ocupacional, de maneira que recupere suas habilidades sociais, consiga interagir com outras pessoas e tenha qualidade de vida.
Sintomas
Os sinais da esquizofrenia variam de paciente para paciente e devem durar mais de 30 dias para caracterizarem a doença, mas os mais comuns são:
- Alucinações (a pessoa ouve vozes ou vê coisas que não existem);
- Delírios (principalmente achar que está sendo perseguida);
- Dificuldades ou perda total da capacidade de expressar emoções (o paciente não consegue demonstrar afeto mesmo com amigos, familiares e pessoas próximas);
- Alterações cognitivas, como perda da capacidade de raciocínio e prejuízo da inteligência;
- Mudanças acentuadas de comportamento (dá risada ou chora sem motivo, conversa sozinha ou fala de forma estranha);
- Agitação exagerada;
- Retraimento social;
- Apatia (a pessoa vive com um aspecto deprimido e deixa de fazer coisas que gostava).
Perfil
A esquizofrenia dá os primeiros sinais no começo da adolescência, entre os homens, e a partir do início da vida adulta, nas mulheres. Não há uma prevalência de sexo e a porcentagem de homens e de mulheres afetados pela doença é semelhante.
“Ela não chega a ser revolucionária, porque já temos três ou quatro medicamentos que têm a mesma forma de aplicação, mas foi muito bem recebida por combinar uma série de vantagens que devem tornar o tratamento mais eficiente e seguro”, comenta o psiquiatra e membro da diretoria da Sociedade Paranaense de Psiquiatria (SPP) Alexandre Karam Joaquim Mousfi.
Hoje, o controle da esquizofrenia é feito com medicamentos que podem ser ingeridos por via oral, com uma combinação de comprimidos tomados uma a três vezes por dia, ou aplicados a partir de uma injeção intramuscular a cada dez, quinze ou trinta dias. “Neste caso, chamamos de medicação de depósito, porque ela é injetada, fica depositada no músculo e vai sendo liberada aos poucos, o que torna seu efeito gradual.”
As vantagens em relação aos tratamentos tradicionais são nítidas. A principal é que a pessoa não precisa tomar o medicamento todos os dias, o que combate um problema muito comum entre os pacientes de esquizofrenia: o abandono do tratamento. “Como os sintomas são controlados e somem após algumas semanas tomando os remédios, o paciente acha que está bem e acaba não levando a sério ou simplesmente abandonando a medicação”, explica o médico psiquiatra do Programa de Esquizofrenia (Proesq) da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) Cristiano Noto.
As consequências disso são graves. Em geral, os sintomas não demoram a voltar e vão se intensificando. Pesquisas mostram que três ou quatro dias sem tomar os remédios são suficientes para que a pessoa tenha um novo surto e haja um aumento considerável nos riscos de internação. Como as crises ficam cada vez piores, cada novo episódio gera danos ao cérebro e, quanto mais surtos, mais debilitadas vão ficando a capacidade de raciocínio, a memória e a inteligência.
Efeitos colaterais
Além da forma de aplicação, outro ponto positivo da injeção é que a substância controla os sintomas e gera menos efeitos colaterais. “Mesmo a versão oral do palmitato de paliperidona, disponível há mais ou menos três anos no mercado, rende uma incidência menor de efeitos colaterais em relação a outros medicamentos, como rigidez no corpo, tremores, diminuição da mímica fácil, problemas sexuais e salivação excessiva, o que facilita a aderência do paciente ao tratamento”, diz Mousfi.
Por enquanto, a desvantagem está no preço, já que cada dose do novo medicamento sai entre
R$ 700 e R$ 1.100. “Mesmo os comprimidos, dependendo da quantidade que a pessoa deve tomar por mês, têm um custo semelhante. Por isso, o médico e o paciente devem avaliar em conjunto a relação de custo e benefício de cada opção para ver qual é mais satisfatória em cada caso”, recomenda o coordenador do ambulatório de esquizofrenia do Hospital de Clínicas (HC) da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Salmo Zugman.
Causas
Problema é genético
Problema é genético
Quanto às causas, o médico psiquiatra Alexandre Karam Joaquim Mousfi explica que os mecanismos da esquizofrenia não estão totalmente desvendados, mas sabe-se que o componente genético faz diferença – 80% dos casos têm ligação com a genética – e é comprovado que filhos ou netos de esquizofrênicos têm maior incidência da doença. Estudos recentes também associam o aparecimento do problema com o uso de maconha. “O risco maior é quando a pessoa combina os dois fatores de risco, então tem predisposição genética e faz uso da droga, mesmo que de maneira esporádica ou por pouco tempo durante a vida.”
Nenhum comentário:
Postar um comentário