Jonathan Campos/ Gazeta do Povo

Ninguém protege o viajante
Sem postos da Anac – sete deles, inclusive o do Afonso Pena, foram fechados em 2010 –, quem tem conflito com companhias aéreas precisa ir à Justiça ou ao Procon
Publicado em 21/05/2012 | PEDRO BRODBECK, COM AGÊNCIA O GLOBO
Atrasos nos voos, falta de informação aos passageiros, passagens caras para os padrões internacionais e multas salgadas na remarcação dos bilhetes fazem parte da rotina dos aeroportos. Sem uma fiscalização eficiente da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), os passageiros estão cada vez mais reféns das companhias aéreas. Esta realidade se traduz nas queixas dos usuários do transporte aéreo. Somente no ano passado, o Procon-PR foi acionado 715 vezes para registrar reclamações contra empresas de aviação ou prestar orientações sobre esses serviços –quase três vezes maior do que o número de ocorrências registradas pelo órgão em 2008.
As queixas e dúvidas mais freqüentes dizem respeito a cobranças indevidas, cancelamentos do serviço e descumprimento de ofertas. Cláudio Candiotta, presidente da Associação Nacional em Defesa dos Passageiros do Transporte Aéreo, diz que o crescimento no número de passageiros não deveria ser justificativa para o aumento das reclamações.
Defesa
Anac diz que queixas podem ser apresentadas por telefone e pelo site
A Anac alega que recebe as no seu site pelo link “Fale com a Anac” de seu site (www.anac.gov.br) e pelo telefone . Além de enviar suas queixas, os passageiros também podem avaliar as companhias e aeroportos com notas de 1 a 10 em diversos critérios que resultam em um índice de avaliação popular dos serviços aéreos. As empresas ficam reanqueadas de acordo com a média que recebem dos consumidores.
Mais de 7,5 mil passageiros já fizeram 19 mil avaliações sobre as companhias. Segundo a agência, a ferramenta permite que o consumidor possa consultar as notas das empresas e escolher aquela que apresente os melhores índices.
Novas regras podem melhorar fiscalização
No final de 2011 entrou em vigor uma resolução da Anac que determina que aéreas ofereçam atendimento presencial para queixas em aeroportos com movimentações acima de 500 mil passageiros por ano, como é o caso do Afonso Pena. De acordo com a agência, que fiscaliza os atendimentos, as empresas devem ser capazes de recepcionar e registrar por meio de protocolo reclamações em relação aos serviços e adotar os procedimentos necessários para a solução imediata, quando possível.
“Se o passageiro tivesse uma melhor assistência, estima-se que metade dos problemas poderiam ser solucionados sem que precisassem ir à justiça”, afirma Cláudio Candotti, presidente da , presidente da Associação Nacional em Defesa dos Passageiros do Transporte Aéreo (Andep).
Com a justificativa do aumento do número de usuários do transporte na última década e o consequente crescimento no número de reclamações contra as empresas do setor, um projeto de lei que trata da regulamentação do recebimento de reclamações contra as companhias aéreas está em discussão na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado. O projeto do senador Sérgio Souza (PMDB-PR) determina que a Anac mantenha uma página na internet para as queixas e que publique indicadores de desempenhos das empresas.
Aeroportos do Paraná não têm juizados
Nos aeroportos Santos Dumont e Galeão (no Rio de Janeiro), Congonhas e Guarulhos (São Paulo), Juscelino Kubitschek (Brasília) e Confins (Belo Horizonte), os passageiros em conflito com companhias aéreas podem contar com assistência da Justiça, por meio de juizados especiais. Os aeroportos paranaenses não contam com esse recurso. As queixas podem ser apresentas nos juizados especiais das comarcas.
Desde outubro de 2010, o Juizado Especial Cível de Curitiba recolheu 1147 ações contra companhias aéreas. As principais reclanmações são referentes a atrasos e cancelamentos. “Temos casos de ações que são iniciadas nestes postos dentro de aeroportos que são encaminhadas para cá quando não há a solução imediata”, explica Elenice Maria Kaipers, chefe do setor de protocolo do Juizado Especial.
Passageiros alegam que, por descrença nos órgãos competentes, falta de tempo e excesso de burocracia, muitas vezes deixam de procurar seus direitos junto à agência nacional ou à justiça. O engenheiro Maurício Tadeu já enfrentou uma série de problemas com cancelamento de voos em diversos aeroportos do país, mas nunca levou adiante suas reclamações. “A gente se acostuma a reclamar na hora, no guichê da companhia, mas depois acaba deixando passar e tolerando excessivamente estes problemas”, explica.
Em Curitiba e Foz do Iguaçu, onde estão os dois principais aeroportos do estado, os passageiros ainda não têm a quem recorrer, exceto os guichês das companhias aéreas. Nenhum dos terminais conta com postos da Anac para atendimento aos clientes, como acontece em São Paulo e no Rio de Janeiro. Reclamações direcionadas à agência devem ser encaminhadas para o site ou via telefone. Em 2010, a agência fechou seus postos de atendimento aos clientes em sete aeroportos pelo Brasil, entre eles o Afonso Pena. A alegação foi de que a procura nos terminais era muito baixa. De acordo com Candiotta, a agência reguladora é ausente e o passageiro não tem a quem recorrer senão ir à justiça.
O advogado Robert Chede Neto recorreu ao serviço de reclamações da Anac em uma das vezes que teve problema com seus voos. Chede havia trocado pontos de um programa de milhagens por uma passagem para São Paulo. No dia em do embarque, os funcionários da Gol fizeram uma greve. Na emergência, o advogado teve que comprar uma passagem de outra companhia, por R$ 400. “Procurei a Anac, mas só preenchi um formulário e fui orientado a abrir uma ocorrência no site da agência”, relembra. No final das contas, ele teve sua pontuação de milhagem recuperada. “Mas tive que arcar com gasto de uma nova passagem na hora.”
A professora de história Mariana de Oliveira teve um dia de trabalho descontado porque não pôde embarcar de Foz do Iguaçu para São Paulo. Ao chegar ao aeroporto com o marido, a companhia aérea informou que só havia um lugar e que o casal teria que decidir quem viajaria. Ela acabou ficando porque o marido tinha um compromisso mais urgente. Depois de reclamar, ela conseguiu um transfer para levá-la ao destino e mais R$ 300 para excesso de bagagem, mas a escola onde trabalhava não aceitou como justificativa o documento cedido pela companhia: uma cópia de um comprovante, com uma explicação superficial do problema. Ela, que faz o trecho entre Foz do Iguaçu e São Paulo com frequência, reclama da atenção com o passageiro na cidade, que é um destino turístico importante. “Um posto da Anac deveria ser instalado no aeroporto de Foz. Uma fiscalização efetiva também evitaria que as empresas agissem por conta própria. O aeroporto de Foz é uma terra sem leis onde cada companhia faz o que acha conveniente”, diz.
Fiscalização firme reduziria pressão sobre a Justiça
Agência O Globo
Os juizados especiais que operam nos seis aeroportos mais movimentados do país receberam 25.117 reclamações no ano passado. Destas, apenas 15,8% foram solucionadas.
Como faltam representantes das empresas nos terminais para deliberar sobre indenização, as queixas são empurradas para a Justiça comum. Além das deficiências no serviço, como a falta de informação ao usuário quando há atraso – uma das principais queixas aos Juizados – os passageiros reclamam dos valores das passagens, acima das tarifas internacionais.
Segundo o juiz Ricardo Chimenti, da Corregedoria Nacional de Justiça, o número de queixas é significativo. Ele destaca que uma fiscalização mais rigorosa por parte da Anac poderia gerar menos processos. “Se houvesse fiscalização mais firme, o serviço não falharia tanto, e os juizados não seriam tão acionados”, observa.
José Carlos de Oliveira, especialista em direito administrativo da Unesp, de Franca, aponta que a falta de concorrência se reflete em preços elevados. “O mercado livre é o ideal para o desenvolvimento do setor, mas no Brasil não dá certo, resultando em problemas de atendimento, desrespeito ao consumidor e ineficiência das companhias”, afirma.
Jorge Eduardo Leal Medeiros, professor da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP), diz ainda que é preciso melhorar a estrutura aeroportuária e estimular a concorrência, com a aviação regional. “Hoje a questão é como sustentar os aeroportos menores. É preciso que o governo, por meio da Anac, faça um plano de investimento”, diz.
Colaborou Denise Paro, de Foz do Iguaçu.

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